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domingo, 5 de setembro de 2010

Espelho meu, espelho dela



Ela entrou e saiu da minha vida. E entrou de novo. Saiu de madrugada na ponta do pé, teve medo que eu me envolvesse. Eu fingi que dormia e que não vi, tinha medo que ela ficasse. Eu dizia: “Não, ela não, já chega!! Menina doida.Aff! É legal, bonitinha, mas é doida, doidinha da silva, coitada”. É esquisita, todos dizem, todos acham. Até a astrologia, na qual ela é viciada, joga na sua cara a sua esquisitice. "Aquário - o signo dos esquisitos". O porteiro diz "Essa menina é esquisita!" mas sorri e da bom dia, e ela retribui enquanto tenta engolir o café da manhã quase caindo das suas mãos entre livros e pastas, porque pra variar, perdeu a hora. As meninas a olham, não tinham coragem de ser ela; "Deus me livre! É muito esquisitinha, gostamos do fato de sermos fáceis de ler, nos abre portas a cada esquina". O que elas não sabiam, é que ela não queria as portas da esquina, e disso ela sabia bem. As portas pequenas e fáceis não lhe eram muito abertas, pois ela não obedecia aos padrões baratos e comuns, obrigatoriamente necessários para se trabalhar para pessoas triviais e habituais. Ela queria seu próprio castelo, e não queria ganhá-lo na mega sena, ela queria conquistá-lo, pois aprendeu cedo a dar valor as coisas conquistadas por ela mesma. Por isso acorda cedo para escovar os dentes, e me aparece sonolenta no espelho do banheiro todas as manhãs. Ela fala alto, e as vezes ri também. Come com aquela fome que faz todos a volta se perguntarem pra onde raios vai tanta comida afinal. Acho que ela é magra de ruim. Até seu metabolismo é esquisito. Ela põe um pouquinho de cabelo atrás da orelha, e ri enquanto esta brigando e deveria estar serio. As vezes sem necessidade, quando viu já coçou a nuca, mal sinal, ela vai se zangar. Se expõe demais, doa-se muito fácil a um sorriso transparente, e as vezes, aos não transparentes também. As vezes não age, apenas sorri, vai para o meio da pista e deixa acontecer a obra do acaso. As vezes tão segura e leve, age e pronto, mas sai antes do despertador tocar. As vezes, só para buscar o café da manhã, as vezes, para procurar onde deixou a cabeça, bem longe dali, deduz. Ela nunca sabe, quem dirá eu. Ela até tenta fazer a linha blasé, séria, recatada e misteriosa, mas quando viu já esta rachando de rir de alguma piada boba, e que as vezes nem era uma piada. Mas pior que isso, é quando ela ergue a sobrancelha direita e despeja suas teorias de mesa-de-bar. Chata, chata, chata!!! Há! Mas ela nunca sabe tudo e não tem vergonha disso. -Não conheço, o que é?- As vezes ela tem umas tiradas que ninguém entende, as vezes nem ela mesma entende. Ela se encanta com o mundo e suas minúcias a ponto de dançar sem música, ou seja, só pode ser doida. Os momentos em que não se sente em seu habitat natural, sai à francesa, deixa por minha conta, ela sabe que sempre dou conta. Ela esta em mim, e eu estou nela. Por várias vezes quero domesticá-la, domá-la, ensina-la a ser mais durona. Mas do que adianta, se meu próprio coração é vulnerável. Quero que ela seja menos mística, mas categórica, seletiva e inalcançável, porque sei que assim as pessoas vão querê-la mais. Pois a verdade é que sempre se interessam por quem não lhes da muita atenção. Parece algo haver com superação, ego, em se fazer merecer. Mais quando chego, lá esta ela, abrindo sua vida para o primeiro sorriso que lhe abriram, cheia de sorrisos. Lá esta ela na frente da televisão, escrevendo àquelas receitas da Ana Maria Braga em seu caderninho, e que guarda pra fazer em dias especiais, porque acordou sem nenhum motivo aparente, super animada e disposta. Ela sabe a discografia de Chico Buarque de trás para frente, mas dança Lady Gaga até o chão e até a segue no twitter. Apesar de tudo as vezes acorda se sentindo a mais banal da sua espécie, mesmo Amelie Poulain sendo o seu alter ego. Uma vez ela comprou algemas em um sexy shop, e nesse dia se sentiu a mulher mais descolada e moderna do mundo. Ela ri até chorar com “A era do gelo” e vai do riso ao choro com “Procurando Nemo” e se sente feliz e privilegiada por ainda poder ser tão boba. Ela sempre chega depois, vai nas boates nos dias errados, liga para quem não deveria, deixa de ligar para quem deveria. À muito não liga para ninguém, apesar de ainda aguardar a sua princesa encantada com uma rosa na mão. Ela gosta do amarelado das fotografias, mais odeia roupas de cor amalera, ela acha brega, nem ela sabe porque. Ela não é nada interessante, ela só é complicada, o que a primeira vista pode parecer um estilo cult, mas no fim das contas, é só bobeira e esquisitice mesmo. E enquanto estou aqui cercada por essa bolha que me protege do mundo primitivo e preconceituoso, a invejo. Ela esta lá fora, pulando e saltitando de um lado para o outro, tentando agarrar a vida que acabára de pousar em uma flor para se alimentar, e ela a observa com um sorriso atencioso. E eu a vejo, ela sou eu.

4 comentários:

lanashorty disse...

Velhooooo, como vc faz isso??? Todos os textos são perfeitos, velho!! Xoxo..\o/

Bruna Fernanda, 29 anos! disse...

Interessante \0/
Gostei
Vou seguir
Eu sou a @Buga30 do seu twitter
;)

Bjoooooo

Cris Garcia disse...

Muitas vezes queremos equilíbrio, mas tentamos de forma inútil desviar de alguns caminhos. Até os excessos são importantes em busca da nossa medida exata! Adoro a forma como vc escreve amiga... outro dia vc me perguntou se vc tinha cara de escritora... eu digo que vc tem alma de escritora, uma forma intensa de sentir o q acontece ao seu redor.

Sinuca-breja-bossa disse...

Lanashorty: Fico sem palavras. Só me resta agradecer e esperar que você continue sempre curtindo. Obrigada!

Bruna Fernanda: Obrigada linda. Volte sempre!

Cris: Amiga linda, vc me desmorona com seus comentários.é verdade "Nunca sabemos qual defeito sustenta nosso edifício inteiro" já dizia a sábia Clarice. Obrigada por caminhar ao meu lado!