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terça-feira, 26 de abril de 2011

A imagem



A última vez que a vi ela estava alí, dentro da banheira quase sem água, nua, fumando um cigarro, de brincos como sempre. Eu sei de tudo, eu continuei a limpar o borrado da maquiagem, a passar o batom na frente do espelho que a refletia e não me deixava sair totalmente daquele espaço apertado do nosso banheiro, lembrando de algo que sempre esqueço e me pergunto porque nunca escrevo em um papel afinal, no fundo é pra sempre depender de você, você sempre lembra por mim, pra mim, mas não te perguntarei, não dessa vez. Você acende outro cigarro, não pretende sair dali tão cedo, era proposital, o seu olhar concentrado no celular ao lado lembrava a quem quisesse saber que tudo já passou. Em algum lugar no tempo eu estava alí, junto, sem roupas, sem medo e sem tristeza. Você fica na banheira, eu pego a bolsa e as chaves, por favor não esqueça de alimentar o cachorro.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Doces ou travessuras


(foto-autor desconhecido)


Se você amasse como corria com o pé enlameada pela rua, tentando tocar e paralisar alguém. Se você sentisse a dor com a disciplina de quando sabia que já era hora de voltar pra casa. Se você planejasse como se não precisasse, apenas pelo simples e leve fato de querer. Se você nunca tivesse deixado de acreditar que cavalos de fogo viriam, que bolas quadradas chegariam num trenó. Que você não precisaria lutar, nem se cansar, o universo inteiro estava no seu quintal e tinha tudo o que você precisava para ser feliz. E se quando você voltasse ele estivesse daquele mesmo enorme tamanho de anos atrás. Se cada aprendizado, cada dor, cada experiência conseguisse nos mostrar nos mínimos detalhes como é importante guardar a salvo o menino que dorme no nosso peito e levanta para brincar de vez em quando. Se o nosso coração soubesse quantos “Se’s” seriam necessários para formar uma certeza, não precisaríamos ter tanto medo dos riscos, das palavras, dos gestos, dos passados. Se falar tudo sem ter medo fosse saber viver, por serem apenas palavras, e são apenas lágrimas, e são apenas medos, e são apenas tudo um grande parque de diversão e na pior das hipóteses você andaria mais de uma vez naquele trem fantasma e você não teria medo de não chegar ao fim rindo de tudo. Que essa quantidade de doces que você tem nas mãos agora, seriam para presentear aquele, aquela, qualquer um, como o mais singelo dos gestos simples, porque era de coração,mesmo que só tivesse te custado algumas moedinhas, mas ninguém ligava pra isso, e ninguém chorava a não ser por mais doce. E esperando que o mundo fosse um grande quintal encantado e que ser criança não fosse uma fase, mas uma solução, uma saída.